19 mar O Desafio de se ter um Projeto de Estado
Por Mauri Cruz
Olhando a trajetória recente do Rio Grande do Sul podemos observar um padrão no resultado das eleições. Desde a abertura política iniciada em 1982 alternaram-se os projetos sem que, nenhum segmento, tivesse a oportunidade de desenvolver, ao longo de pelo menos oito anos, suas estratégias de governo.
Mais que isso. Partidos políticos com programas muito próximos ideologicamente não conseguem produzir alianças capazes de gerar uma hegemonia consistente por um período relativamente longo. Só para se ter uma ideia, na primeira eleição direta para governador pós ditadura em 1982, a divisão dos setores progressistas que eram maioria na sociedade gaúcha, permitiram a eleição de Jair Soares do PDS, partido da ditadura militar. Mas a divisão se repetiu nos processos seguintes. Em 1986, o PDS perde o Governo para o PMDB de Pedro Simon. Em 1990 o PMDB perde o governo para o PDT de Alceu Colares. Em 1994 o PDT perde o governo para o PMDB de Antônio Britto. Em 1998 o PMDB perde o governo para o PT de Olívio Dutra. Em 2002 o PT perde o governo para o PMDB de Rigotto. Em 2006 o PMDB perde o governo para o PSDB de Yeda Crusius. E em 2010 o PSDB perde o governo para o PT de Tarso Genro. Imaginemos nós se um destes projetos tivesse a oportunidade de governar o estado por mais quatro anos? Quais projetos teriam se consolidado? Como estaríamos hoje enquanto projeto de estado?
Claro, dependendo do interlocutor e do período escolhido a opinião pode se alternar entre a glória ou a tragédia. Mas é um raciocínio necessário. A alternância tem sido uma das causas do fraco desempenho do RS no cenário nacional. Inicia-se projetos e estratégias que, antes de se consolidarem, estarão sendo destruídas pelos governos sucessores. A verdade é que os gaúchos não se deram a oportunidade de acompanhar o desempenho de um determinado projeto de governo por um tempo suficiente para surtir seus efeitos. Todos sabemos que quatro anos é pouco para se iniciar um mandato, organizar a casa, elaborar projetos, captar recursos, constituir um razoável acordo político com os principais segmentos e implementar os projetos. Tenho sempre em mente que a primeira gestão do PT em Porto Alegre não seria bem lembrada se Tarso Genro não tivesse sido eleito prefeito em 1992, e depois Raul Pont em 1996 e novamente Tarso em 2000. Foram as vitórias consecutivas que permitiram a síntese do sucesso da gestão anterior e a possibilidade de consolidação dos projetos.
Isto não quer dizer que devemos suprimir as eleições ou que sempre a alternância no poder é nociva. Não é neste sentido. A pergunta que fica é, porque num estado tão politizado e com forças políticas tão consistentes não se consegue construir alianças mais duradouras com projetos de médio e longo prazos capazes de implementar projetos consistentes e duradouros?
Na vivencia do Conselho de Desenvolvimento Econômicos e Social – CDES/RS tive a oportunidade de conviver com dirigentes que representam segmentos e interesses dos quais divirjo. No entanto, a metodologia do Conselhão era da busca dos consensos, de aproximar aquilo que nos une e de superar as divergências pelo diálogo e defesa de ideias. Se não havia consenso sobre uma matéria, sem problemas, se partia para outra. Havia sempre um sentido básico a mobilizar o debate. O bem comum.
Isso permitiu que sem-terras e fazendeiros pudessem produzir alguns acordos que foram bons para todos. Que movimentos sociais e empresários chegassem a alternativas que atendesse, minimamente, as expectativas de cada segmento. Procurando, parece que sempre há um ponto de convergência. Não é necessário vivermos em luta política constante, sempre vendo o outro como inimigo mortal.
Para quem não está enfronhado na disputa eleitoral imediata, muitas vezes, não dá para entender como lideranças que pensam e agem de forma muito semelhante se entrincheiram em posições tão opostas. Infelizmente é o que estamos vendo neste momento na disputa em nosso estado. PDT e PSB, por exemplo, que comungam de opiniões e práticas semelhantes ao PT e PCdoB, disputam o voto popular como se, eleitos, fossem apresentar um programa de governo distinto do que está em andamento. É legítimo, sem dúvida. Mas que produz um grande risco de retrocesso e perdas para a população gaúcha. Mais uma vez o fenômeno da descontinuidade pode se repetir e um projeto que começa a dar certo irá ser interrompido.
O que mais se ouvia nos pampas é que tínhamos perdido espaço para outros estados da federação. Durante os dois mandatos do Presidente Lula, enquanto os demais estados cresciam, nós estávamos estagnados. Nos últimos quatro anos, reencontramos um rumo para o desenvolvimento, ainda tênue e limitado, mas iniciamos um processo de retomada do papel do estado, fortalecimento da economia regional e qualificação dos serviços públicos. Se continuarmos nesta linha nos próximos quatro anos poderemos consolidar políticas e realmente melhorar a qualidade de vida do nosso povo. Mas se dermos mais importância para as disputas táticas do que para um projeto de estado, corremos o risco de barrar, mais uma vez, o início de processo de retomada do desenvolvimento, retrocedendo mais quatro anos.
O único consolo é que esta escolha não é apenas das lideranças que se aventuram em cada processo eleitoral, mas é também dos eleitores que tem a opção de embarcar em falsas promessas ou escolher o melhor caminho. Espero que em 2014 a escolha da maioria seja pela continuidade. Seria muito bom para todo o Rio Grande do Sul, não só para os partidos vencedores da eleição.
(Artigo publicado em 20 de julho de 2014)
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